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domingo, 22 de setembro de 2013

A propriedade do professor


Ao amigo Webster Lima, in memorian.

          Professores deveriam ser imortais. Em um mundo atribulado, resguardado pela frieza das máquinas, das impessoalidades, quem ainda é capaz de distribuir algum tipo de humanidade é o professor. Quebrem-se os aparelhos de telefonia móvel, interrompam-se as redes sociais, apaguem-se as luzes, mas nunca, nunca mesmo, silenciem um professor. Sequer a morte, despreparada, cega, injusta, nem mesmo Ela em sua sacrossanta labuta de reciclar almas pode limitar o alcance da voz de um professor. A despeito das maquinações, das desumanidades, da capitalização do conhecimento, a palavra de um mestre, na melhor acepção do termo, pereniza, não teme as estiagens dos que mercantilizam a educação. Ser educador é conhecer. Conhecer gente, conhecer caminhos, conhecer atalhos e saídas, conhecer-se, reconhecer. Ser educador é ser, nada mais, apenas ser, e, nessa perspectiva ontológica, deslocar-se de si para o outro, sem amarras que o impeçam de vasculhar, palmo a palmo, as necessidades de quem por ali se abanca à procura de entender o que quer que seja. Ser educador é mergulhar sem medo nas profundezas oceânicas das relações humanas, enquanto alguns, os que se dizem especialistas, apenas observam da praia. Ser educador é irritar-se com as mesquinharias, as quinquilharias dos que possuem no peito uma engrenagem ou um chip, ou pior, um cofre cheio de coisas vazias. Ser educador é admitir que se pode sobreviver sem as instituições, mas as instituições morrem sem a presença do professor. Ser educador é tatuar na retina do aluno as melhores expectativas possíveis de futuro, é embutir nele o germe da alegria, da esperança, é ralhar de vez em quando, na vontade de gritar que se ama, mas com a decência de pai que protege a cria, mesmo que, para isso, tenha que machucá-la um pouco. Ser educador é ter propriedade de fala e conhecimento e não ser propriedade. 
           As palavras que cá exponho não se devem entender como epitáfio ou revolta. São o que são, palavras. Direcionadas a quem necessita delas, a quem as compreende, a que as tem por verdade ou mentira. Por fim, ser professor é quase tudo, menos submeter-se. Ser professor é ser um subversivo, um comunista mesmo, um bolchevique guevariano da melhor estirpe.  Não há professor que não ame o que faz, uns menos, outros mais, uns mais exaltados, outros um tanto conformados, mas são formas diferentes do mais puro e necessário amor. Seja como for, depois de refletir um pouco, vejo que professores não morrem. Morrer é curva na estrada, já diria o poeta. Morrer é ser esquecido. Jamais esquecemos um bom professor. Jamais. 

Um comentário:

  1. Texto maravilhoso, assim como todas as aulas que tive com você. E como você bem disse: "Jamais esquecemos um bom professor. Jamais." E você sem dúvidas foi o melhor professor de português que eu já tive na vida. Obrigado.

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