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segunda-feira, 14 de abril de 2014



          O alento desmedido da aurora tecia as horas, conspurcando-lhes a genuinidade. Todas as manhãs assim seguiam, irresolutas, com o amargor do anteontem; a piçarra estendia-se ao correr das vistas A claridade ofendia as retinas, que se esbranquiçavam em manchas algodoadas. Os pés nus do caboclo e o leito rachado do açude do Careta davam-se como amantes antigos. Os bichos e os homens sustinham-se nos ossos. A terra era sem forma e vazia. E houve luz. Maria do Amparo, filha do artesão dos pífanos, cuidava de buscar água no barreiro. Maria Caçula atiçava o fogo, que era ofício seu dar gosto ao feijão. Água e sal. Botava olho também nas três curuminhas mofinas que teimaram em vingar na salmoura do tempo. Maria de Jesus, a mais velha, cambitos finos, mirrava-se no terraço - de tão magra, não tinha sombra;  Maria Mercês, nem grande, nem pequena, olho espantado do sopro abafadiço que corria no terreiro (hálito do coisa ruim!); Maria dos Anjos, arruinada por uma doença que a impossibilitava de andar e falar, escaveirada. De não mais caber vivente, o sítio, de nome Comum, ainda guardava em sua taipa a velha Maria Mocinha, arguta e senhora dos interesses alheios. A comida escasseava. Lá vinham os baldes com lentidão, debitados nos braços de Amparo, a mais rija das Marias, descabimento de força.


continua...

          

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