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quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Jornal amanhã, em edição extraordinária



          Eliza era universitária. Depois de muito penar, finalmente conseguira a tão sonhada vaga em uma universidade pública. Aproveitara o sistema de cotas. Com o início do curso, a velha dificuldade: não conseguia acompanhar o ritmo frenético das aulas. O olhar inquiridor dos colegas de sala parecia denunciar que ela era mais um desses cotistas. Os que conseguiram a vaga por meio das cotas andavam sempre juntos, como que se protegendo. Com o tempo, percebendo que os cotistas precisariam de acompanhamento especial, os diretores dos cursos decidiram criar turmas exclusivas para eles. Não tardou e essa separação impregnou outros setores do campus. Construíram banheiros exclusivos para os cotistas. No refeitório, setores eram reservados para os cotistas. Chegou-se ao ponto de construir-se um enorme muro, atravessando o campus, para evitar que os cotistas mantivessem contato com os outros, pois, segundo alguns teóricos, havia razões científicas para acreditar que os não-cotistas seriam uma raça superior. Contrataram seguranças, deram-lhes armas e ordens expressas para atirar em qualquer um que se atrevesse a burlar as normas do muro. Aos poucos, esse muro, voraz e frio como qualquer outro muro, estendeu sua sinuosidade para fora dos campi. Eliza e outros passaram a ser identificados por um código de barras tatuado no pulso direito. Não havia mais o que fazer. E pensar que tudo isso poderia ser evitado com investimento maciço na educação básica pública. Agora é tarde.

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